quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Força-tarefa investiga se ‘oceano verde’ da Amazônia está em risco

FONTEagencia.fapesp.br/186 Por Karina Toledo, de Manaus
Projeto GOAmazon coletará dados durante dois anos para entender como a poluição de Manaus pode alterar as características das nuvens da região e afetar o regime de chuvas (foto: João Carlos Figueiredo)
Agência FAPESP – As nuvens que pairam sobre a Floresta Amazônica possuem características similares às das nuvens existentes em regiões de alto mar. Como há muita umidade na atmosfera e baixíssima concentração de material particulado – que oferece superfície para condensação do vapor d’água – as gotas aumentam de tamanho rapidamente e logo adquirem massa suficiente para precipitar.
Essa particularidade da floresta tropical foi descrita pela primeira vez em 2004, em um artigo publicado na revista Science por cientistas que participavam do Large-Scale Biosphere - Atmosphere Experiment in Amazonia (LBA) – um programa de cooperação internacional liderado pelo Brasil. A descoberta rendeu à Amazônia a alcunha de “oceano verde” (green ocean).
O mesmo estudo sugeriu, porém, que a eficiência amazônica na produção de chuva estaria ameaçada pela crescente poluição resultante da urbanização e da queima de biomassa. Isso porque o aumento de material particulado (partículas de aerossóis) na atmosfera criaria uma quantidade maior de núcleos de condensação da água e, consequentemente, reduziria o tamanho das gotas e retardaria todo o processo de precipitação.
“Se a poluição estiver, de fato, alterando as características das nuvens na Amazônia, a consequência será uma mudança significativa no regime de chuvas. E alterar o equilíbrio hidrológico de uma região gigantesca, responsável por controlar o transporte de umidade para o sul do país, pode trazer impactos importantes nas regiões Sudeste e Centro-Oeste”, afirmou Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e coautor do artigo publicado na Science.
Para testar a hipótese do efeito da poluição sobre as nuvens e avançar no conhecimento sobre os processos de formação de chuva e a dinâmica da interação entre a biosfera amazônica e a atmosfera, teve início em janeiro deste ano a campanha científica Green Ocean Amazon (GOAmazon), que reúne pesquisadores de diversas universidades e institutos brasileiros e norte-americanos e conta com financiamento do Departamento de Energia dos Estados Unidos (DoE, na sigla em inglês), da FAPESP e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), entre outros parceiros.
“O uso dos recursos naturais pelos seres humanos se acelerou nos últimos 30 ou 40 anos. A pergunta que estamos tentando responder com este experimento é: até que ponto podemos poluir, arrancar árvores e mudar o clima? Até quando a Terra vai suportar?”, disse Scot Martin – professor da Harvard University, nos Estados Unidos, e idealizador do GOAmazon ao lado de Artaxo – durante o lançamento oficial do programa no Amazonas, no dia 18 de fevereiro.
De acordo com Martin, a cidade de Manaus e seu entorno configuram o laboratório ideal para esse tipo de investigação. Isso porque a capital amazonense – com várias usinas termelétricas, quase 2 milhões de habitantes e 600 mil carros – está rodeada por 2 mil quilômetros (km) de floresta. Na época das chuvas, a região chega a ter níveis de material particulado tão baixos quanto os existentes na era pré-industrial.
Em 2010, Martin submeteu ao DoE uma proposta para trazer ao Brasil a infraestrutura do Atmospheric Radiation Measurement (ARM) Facility – um conjunto móvel de equipamentos terrestres e aéreos desenvolvido para estudos climáticos, principalmente sobre o processo de formação de nuvens e de transferência de radiação.
Com o projeto aprovado, uma parceria entre DoE, FAPESP e Fapeam foi articulada para potencializar o uso do observatório móvel por cientistas do Brasil e dos Estados Unidos. O resultado foi uma chamada conjunta de propostas lançada em 2013 com financiamento total de R$ 24 milhões.
Seis projetos foram aprovados e se somaram a outros já em andamento, como o Temático “Processos de nuvens associados aos principais sistemas precipitantes no Brasil: uma contribuição à modelagem da escala de nuvens e ao GPM (Medida Global de Precipitação)”, coordenado por Luiz Augusto Toledo Machado, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e o Temático “GoAmazon: interação da pluma urbana de Manaus com emissões biogênicas da Floresta Amazônica”, coordenado por Artaxo e Maria Assunção Faus da Silva Dias, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP.
Atualmente, a Fapeam está com um edital aberto para pesquisadores amazonenses interessados em se unir à campanha do GOAmazon.
Em janeiro de 2014, o ARM Mobile Facility (AMF) começou a ser instalado na cidade de Manacapuru, a cerca de 100 quilômetros a oeste (vento abaixo) de Manaus. O local foi escolhido porque recebe em pelo menos metade do ano a pluma de poluição da capital trazida pelos ventos alísios, que sopram de leste para oeste. No restante do tempo, a região recebe apenas ar muito limpo, sendo possível comparar as duas situações.
O observatório móvel é composto por 11 contêineres repletos de sensores, radares e outros equipamentos apropriados para coletar e analisar as partículas de aerossóis e os diversos gases presentes na atmosfera, além de medir propriedades de nuvens e parâmetros meteorológicos como temperatura, umidade e velocidade dos ventos. Outros quatro contêineres foram instalados no sítio de pesquisa – batizado de T3 – pelos parceiros brasileiros do GOAmazon.
Contêineres do ARM instalados no município de Manacapuru (foto: Eduardo Cesar)

Ao todo, 50 pesquisadores trabalham no local e acompanham diariamente as medições para garantir que seja adquirido o melhor e mais completo conjunto de dados durante a operação. Os extensos dados serão colhidos continuamente até dezembro de 2015 – prazo previsto para o término do experimento.
“O ARM-AMF já esteve em países africanos, como a Nigéria, na Alemanha, na China e na Índia. Mas é no Brasil que ficará pelo período mais longo. É o maior experimento que nós, do DoE, já fizemos”, comentou Wanda Ferrel, diretora do programa ARM.
Sítios complementares
Durante os quase 100 quilômetros que a pluma de poluição de Manaus percorre até Manacapuru, as partículas interagem com os gases da atmosfera e chegam ao destino final bastante modificadas. A localização do sítio T3 tem a vantagem de possibilitar aos cientistas estudar o resultado dessa transformação e seu impacto nas nuvens e no clima local. No entanto, observou-se a necessidade de comparar os dados com medições feitas em locais expostos mais diretamente à poluição manauara.
Com apoio da FAPESP, por meio do projeto Temático coordenado por Artaxo, um contêiner com equipamentos semelhantes aos existentes em Manacapuru foi instalado no município de Iranduba, situado na margem do Rio Negro oposta à cidade de Manaus. O sítio de pesquisa sediado dentro do hotel de selva Tiwa é chamado pelos participantes do GOAmazon de T2.
Paulo Artaxo apresenta a pesquisadoras norte-americanas os equipamentos do contêiner
instalado no município de Iranduba
 (foto: Eduardo Cesar)

Em uma primeira análise dos dados que estão sendo coletados desde janeiro, o grupo de Artaxo, formado por 10 pesquisadores, já encontrou resultados impressionantes.
“Observamos no T2, em Iranduba, concentrações significativas de dióxido de enxofre não detectadas no T3, em Manacapuru. Também notamos que em ambos os sítios de pesquisa há forte predominância de aerossóis orgânicos – responsáveis por até 85% da massa das partículas –, mas a composição química muda radicalmente de um local para outro, como resultado dos processos químicos atmosféricos. Observamos ainda, em Manacapuru, níveis duas vezes mais altos de ozônio do que os verificados em Iranduba”, contou Artaxo.
De acordo com o pesquisador, a concentração de ozônio registrada em Manacapuru – algo na ordem de 40 partes por bilhão (ppb) – é alta o suficiente para danificar os estômatos das folhas e, consequentemente, prejudicar o processo de fotossíntese e emissão de vapor d’água.
“Os impactos da poluição atmosférica não são iguais em todos os lugares. Há particularidades nos processos de química atmosférica que aparecem da interação da pluma urbana com os compostos orgânicos voláteis (VOCs, na sigla em inglês) emitidos pela vegetação”, explicou Artaxo.
Os VOCs correspondem a algumas centenas de substâncias – dentre as quais as mais conhecidas são os isoprenos e terpenos – emitidas pela vegetação como resposta ao estresse oxidativo. Um dos objetivos do projeto de Artaxo é descobrir o quanto esse estresse vegetal é intensificado pela poluição, uma vez que os VOCs também podem se transformar em partículas de aerossóis, funcionar como núcleos de condensação de nuvens na atmosfera e interferir nos processos de formação de nuvens e de chuva.
Outro projeto em andamento no âmbito do GOAmazon, sob coordenação de Jeff Chambers, do Lawrence Berkeley National Laboratory, órgão ligado ao DoE, tem como objetivo aprofundar o conhecimento sobre as funções do VOCs na fisiologia das plantas e entender como as emissões mudam de acordo com a quantidade de luz, de chuva e como tudo isso afeta o ecossistema florestal. As medições do grupo de Chambers estão sendo feitas em um conjunto de torres situado 50 km ao norte de Manaus, próximo ao km 34 de uma estrada de terra conhecida como ZF2.
Uma das torres usadas para medir emissões de compostos orgânicos voláteis
 (foto: Eduardo Cesar)
Outro conjunto de torres usado pelo grupo fica na Reserva Biológica de Uatumã, uma área de floresta distante 160 quilômetros a nordeste de Manaus, onde a poluição urbana não chega. No local, chamado de T0, está sendo construída uma torre de observação com 320 metros de altura pertencente ao projeto Torre Alta de Observação da Amazônia (ATTO, na sigla em inglês) – uma parceria do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa) com o Instituto Max Planck de Química, da Alemanha.

O ATTO, cujo objetivo é compreender melhor a interação entre a biosfera e a atmosfera, é liderado por Antonio Ocimar Manzi, pesquisador do Inpa e coordenador-geral do GOAmazon no Brasil.
A infraestrutura para coleta de dados do GOAmazon conta ainda com duas torres instaladas dentro da cidade de Manaus, na sede do Inpa (sítio T1), além de sítios complementares de projetos associados, dois balões meteorológicos capazes de subir até 2 quilômetros de altura e dois aviões de pesquisa.
Uma das aeronaves, pertencente ao laboratório americano Pacific Northwest National Laboratory (PNNL), chegou ao Brasil no dia 16 de fevereiro e deve ficar até o final de março, quando se encerra o período das chuvas. Durante esse período, serão realizados entre 20 e 25 voos com cerca de 4 horas de duração cada. Entre os vários equipamentos existentes no avião, há sensores nas asas capazes de medir o tamanho das gotas presentes nas nuvens.
Avião de pesquisa Gulfstream-1, do Pacific Northwest National Laboratory (PNNL), dos Estados Unidos
 (foto: Eduardo Cesar)
“Seguiremos a evolução da pluma de poluição até o momento que ela perde sua assinatura, para ver como ocorre esse processo. O experimento foi desenhado com o objetivo de caracterizar a pluma e entender a intensidade e a extensão da perturbação que ela causa na atmosfera da floresta. É um conhecimento que vai muito além do caso específico de Manaus”, disse Karla Longo, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e coordenadora brasileira do projeto Intensive Airbone Research in Amazonia (IARA), parte do GOAmazon.

Uma nova campanha aérea está prevista para ocorrer nos meses de setembro e outubro de 2014, época da seca na Amazônia. Nessa ocasião, as medições serão feitas tanto pela aeronave americana quanto por um avião alemão que voa em altas altitudes. Ambos seguirão o mesmo trajeto, mas em diferentes alturas.
Banco de dados de acesso público
Todas as informações geradas pelos diversos projetos e sítios do GOAmazon estão sendo compartilhadas em um banco de dados de acesso público, com cópias em Manaus, em São Paulo e nos Estados Unidos.
“Somente cerca de 5% dos dados que estão sendo coletados vão ser aproveitados nesse primeiro momento, pois não temos fôlego suficiente para processar toda informação que está sendo coletada. Mas essa base de dados ficará disponível para qualquer pesquisador e para alunos interessados e será uma material riquíssimo para teses e projetos a serem desenvolvidos pelos próximos 20 anos, pelo menos”, avaliou Artaxo.
Para o pesquisador, no entanto, o ideal seria manter uma estrutura permanente, equivalente à montada em Manacapuru, para acompanhar com dados concretos os impactos das mudanças climáticas na Amazônia e nos demais biomas brasileiros. Estruturas como essa, disse Artaxo, existem em diversos locais dos Estados Unidos, da Europa e até mesmo na China.
“O Brasil precisa ter um sistema avançado de monitoramento de mudanças ambientais que estão ocorrendo e impactando fortemente os ecossistemas brasileiros. Ou convencemos o DoE a manter essas instalações por mais tempo no país ou o governo brasileiro implementa um programa nacional voltado a monitorar propriedades críticas dos ecossistemas brasileiros. O ideal seria ter uma rede com estações de medição na Amazônia, na Mata Atlântica, no Pantanal, na Caatinga, no Cerrado, pois cada bioma tem fragilidades diferentes e é importante entender processos que já estão afetando o funcionamento destes ecossistemas”, disse Artaxo.
Além do custo inicial para a aquisição dos equipamentos, o grande desafio é a manutenção e a operação do complexo sistema. Os instrumentos são frágeis, requerem manutenção constante e uma equipe de cientistas acompanhando em tempo integral. A grande dúvida é como seria financiada a empreitada no longo prazo.
Desdobramento do LBA
A maior parte das instalações usadas no GOAmazon tem origem nas pesquisas realizadas no âmbito do LBA, uma cooperação internacional financiada por Brasil, Estados Unidos e Europa que se articulou no início dos anos 1990 e se intensificou entre os anos de 1998 e 2005. O objetivo do LBA é compreender a influência da Amazônia no clima global e entender como as atividades antrópicas e as mudanças climáticas poderiam afetar esse bioma. Recentemente, o LBA iniciou a execução da Fase II do programa, focado nos próximos 10 anos.
Desde 2005 o governo brasileiro assumiu o Programa LBA, mantido com recursos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), sob coordenação do Inpa.
De acordo com Manzi, o GOAmazon representa uma continuação e um aprofundamento de temas antes investigados no LBA. “Já conhecemos muito sobre microfísica de nuvens, mas ainda há muito a aprender. Isso permitirá aprimorar os algoritmos que representam os processos de formação de nuvens e produção de chuva nos modelos climáticos. Resultará não apenas em previsões meteorológicas mais precisas, como também em projeções de cenários futuros mais confiáveis – o que é extremamente importante para a definição de políticas públicas e para o planejamento de longo prazo”, avaliou Manzi. 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A Moratória da Soja, a Ocupação da Amazônia e a Questão Ambiental

Desde 2006, o Greenpeace celebra a assinatura e a renovação anual de um acordo com os produtores rurais, que se comprometeram em não comercializar soja produzida em áreas desmatadas. Aparentemente, um bom acordo para os ambientalistas, não fosse o fato óbvio que todas as lavouras de soja do Cerrado e da Amazônia foram plantadas em áreas que foram devastadas há menos de 50 anos...

Vegetação ciliar às margens do Rio Negro, AM
Os ruralistas declararam, este ano, que seria a última renovação do acordo que, a partir de 2015, seria substituído por um novo compromisso, tomando por base o novo Código Florestal, e os instrumentos criados para o Cadastro Ambiental Rural. Com isto, os ruralistas estariam "legalizando" as inovações que eles mesmos propuseram para a "Gestão Ambiental" e para a "Sustentabilidade Agropecuária", nos moldes do novo código florestal.

Em tese, essas propostas viriam de encontro às reivindicações ambientalistas, e permitiriam que eles continuassem a ter acesso ao farto crédito rural, tomando empréstimos a juros subsidiados, como sempre fizeram, assegurando, a um setor sempre endividado, as benesses e generosidades do poder público e dos bancos oficiais de fomento (Banco do Brasil, Caixa Econômia, BNDES). Quantas moratórias a esses empréstimos foram concedidas nos últimos 50 anos? Quantos "perdões" ou parcelamento de dívidas tributárias foram concedidas aos latifundiários?

Pois bem, vamos aos fatos históricos.

O avanço das fronteiras agrícolas sobre a Floresta Amazônica teve início durante a Ditadura Militar, mas suas origens históricas devem ser debitadas a Juscelino Kubitscheck, que pôs em prática as ideias de Getúlio Vargas, de transferir a capital federal para o Centro-Oeste brasileiro. Seu propósito era a "interiorização do desenvoolvimento". Os militares de 64 deram um cunho estratégico ("Segurança Nacional") a esse objetivo, alegando que a ocupação de nossos territórios da região norte seria imprescindível para a afirmação da Soberania Nacional perante a comunidade internacional, que já olhava com interesse as reservas de minérios e a riqueza biológica da Floresta Equatorial para a indústria farmacêutica.

Extração de madeira de Terra Indígena no Pará
A ocupação da Amazônia se deu pela construção da rodovia Transamazônica, complementada por outras rodovias que cruzaram a floresta em todas as direções, criando extensa malha viária, que tornou possível a migração de povos de todas as regiões do Brasil para as áreas antes inóspitas da floresta, e abrindo novas fronteiras agrícolas para essas populações. Para estimular essa migração foram oferecidas terras da União, que se tornariam o embrião das novas cidades que se instalariam ao longo das rodovias. Gaúchos e nordestinos foram os "desbravadores" desses territórios, inicialmente destinados à agricultura e à pecuária de subsistência.

Hidrelétricas da Amazônia (instaladas e previstas) - clique na imagem para ampliar
Em cerca de 50 anos, um quarto da floresta amazônica foi transformada em campos agrícolas. Junto à agropecuária, outros interesses foram despertados: o garimpo de Serra Pelada, a mineração de Carajás, as hidrelétricas de Tucuruí, de Balbina, do Tapajós, do Madeira, do Xingu... um imenso plano de megaconstruções de hidrelétricas foi desenvolvido, tendo seu marco inicial nos governos militares e sendo reativado nos governos petistas, sob coordenação de Dilma Rousseff, em resposta aos apagões do governo FHC. Toda essa energia gerada na Amazônia tinha como público consumidor as populações do Sul e do Sudeste do país.

Essa estraordinária mobilização de povos e interesses trouxe consigo os graves problemas dos aglomerados urbanos (crimas, prostituição, bebidas, drogas), mas também a grilagem de terras, a pistolagem e os "coronéis" da política e da exploração dos recursos naturais, com gravíssimos e irreversíveis danos ao Meio Ambiente. Tudo isso aliado à corrupção nos bastidores de Brasília.

Queimada em meio à vegetação nativa: o 1º passo para a devastação.
As grandes fazendas que se instalaram inicialmente em Mato Grosso e Goiás, logo estenderam seus domínios para o sul da Amazônia, concentrando-se, principalmente, em Rondônia, Pará e Tocantins. As fronteiras agrícolas se expandiam pela ação de madeireiras, seguidas pela pecuária e pelas grandes plantações de soja.

No período de transição da Ditadura para a nova Democracia o Brasil parou. Passamos por grave crise econômica, combatida por mirabolantes "planos econômicos" nos governos de Sarney e Collor, que levaram o país à estagnação por cerca de uma década. O Brasil herdava, dos militares, uma dívida externa de 100 bilhões de dólares, que foram captados para alimentar o assim chamado "milagre econômico" de Delfin Neto, baseado nas grandes obras de infraestrutura: estradas, pontes, hidrelétricas.

Situação da Transposição do rio São Francisco, dez anos depois de iniciada
Os governos petistas seguiram o mesmo caminho, com projetos questionados até por especialistas, como é o caso do "elefante branco" da Transposição do rio São Francisco, cujo valor previsto, de 3,4 bilhões de reais, já supera hoje os oito bilhões, sendo que grande parte da obra encontra-se em estado de abandono.

Resgatado o equilíbrio das contas públicas, graças à "Lei de Responsabilidade Fiscal" e à privatização das grandes estatais de energia, mineração e comunicações, promovidas por Fernando Henrique Cardoso, o país voltou a crescer e expandir sua Economia, principalmente devido ao Agronegócio e às gigantescas propriedades rurais da monocultura de soja, cana de açúcar, milho, algodão e à criação extensiva de gado. A mineração também deu sua contribuição, produzindo ferro, alumínio, manganês para exportação.

A Economia ia bem, mas o povo e o Meio Ambiente iam muito mal. O salário mínimo não ultrapassava a barreira dos cem dólares, a educação seguia, trôpega, pelas reformas promovidas pelo Acordo MEC-USAID dos tempos da Ditadura, e a mão de obra continuava despreparada para alavancar o crescimento industrial. Enquanto isso, os movimentos sociais bradavam "Reforma Agrária já!", através do MST e outras siglas campesinas.

Por do Sol na Floresta Amazônica
Nesse clima de contradições e de conflitos fundiários, o PT se elegeu presidente, na figura carismática de Lula, e atropelou o poder com sua máquina de arrecadação do Mensalão, enterrando-se na lama da corrupção e dos conchavos políticos, aliando-se aos partidos que havia criticado enfaticamente desde sua fundação no ABC paulista. Os movimentos populares se emanciparam e o poder central viveu dias de "ideal revolucionário", substituindo, em oito anos, toda estrutura de poder político, através dos sindicatos e da barganha de cargos em todos os escalões do governo. Um novo grupo de "revolucionários" petistas, assessorado por intelectuais de esquerda trazidos da Academia, tomou o poder, mas entregou posições estratégicas de ministérios e de empresas estatais para partidos sem qualquer ideário democrático ou compromisso ético com a Nação brasileira.

Percebendo a fragilidade desse governo inexperiente e ávido pelo poder, forças reacionárias, vinculadas às oligarquias e ao latifúndio, se infiltraram no poder, tomando de assalto ministérios como o das Minas e Energia, da Agricultura e Pecuária, e do Trabalho, além de manter grande influência nas decisões políticas e econômicas, principalmente a partir da posse de Dilma Rousseff na Presidência da República. Empreiteiras, mineradoras, banqueiros e latifundiários passaram a frequentar o Palácio do Planalto com a desenvoltura de quem não só faz parte do poder, mas tem a primazia de decidir as questões fundamentais da política e da economia nacionais.

Garimpo em Terra Indígena do Pará, próximo a Belo Monte
Se anos de debates ideológicos entre membros da Academia, Ambientalistas e ideólogos socialistas conseguiram produzir a Constituição Federal, o Código Florestal e os avanços da legislação indígena e quilombola, essas novas alianças do poder jogaram tudo por terra em pouco mais de uma década. Não apenas o Meio Ambiente está ameaçado, mas também o armistício entre trabalhadores e empresários, bem como as conquistas sociais, alcançadas a duras penas, desde o fim dos governos ditatoriais. Bancadas fundamentalistas de evangélicos e ruralistas tomaram o poder no Congresso Nacional, aprovando, em poucos anos, aberrações jurídicas que invalidaram décadas de luta pela Democracia e a Liberdade.

Políticos soterrados nas urnas e no julgamento popular, como Paulo Maluf, Renan Calheiros e José Sarney, foram resgatados pelo PT, transformando as casas legislativas em balcões de barganha e de interesses escusos e fascistas. Essa bancadas dominaram de tal forma o poder que já não sabemos quem governa o país: se o PT de Lula ou se o PMDB de Sarney. O fato é que o país caminha sem rumos, sem planos, sem comando central, deixando passar ao largo a mais espetacular oportunidade histórica de se alçar para níveis de desenvolvimento jamais imaginados, graças à grande crise econômica de 2008, que aniquilou as economias europeias e norte-americanas. A China, o México, o Chile, a Índia e outros países menores que o Brasil se agarraram a essa oportunidade e alavancaram suas economias, deixando o Brasil para trás.

Área alagada pela interrupção do curso de um igarapé
A expansão agropecuária teve como consequência imediata a devastação de nossos principais biomas: o Cerrado e a Caatinga, que encolheram 50%, a Amazônia, que perdeu 25% de sua biomassa, e o Pantanal, que se encontra ameaçado pelo esgotamento de seus recursos hídricos, cujas nascentes se encontram, em grande parte, no Cerrado.

A agricultura e a pecuária seguem sua marcha de devastação, aliadas à mineração e à extração de madeiras, além da mais nefasta política de construção de hidrelétricas, com graves impactos às populações tradicionais indígenas e ao Meio Ambiente.

Nossa maior empresa pública, a Petrobrás, uma gigante do petróleo com áreas potenciais de prospecção, passou, nos governos petistas, a cumprir um papel de reguladora das taxas inflacionárias, mantendo preços deficitários, comprometendo os lucros de seus investidores e minando sua capacidade de investimentos, justo no momento em que foram descobertos poços gigantes de petróleo na plataforma marinha do litoral fluminense, conhecidos pela camada de pré-sal, a grandes profundidades. Uma intensa batalha política tomou conta do Congresso, em uma disputa pelos recursos de exploração do Pré-Sal, que já foram divididos entre os Estados da Federação antes mesmo que sua viabilidade técnica e econômica justificasse a euforia inicial.

Diante desse cenário, talvez a Moratória da Soja não tivesse importância tão relevante para a conservação do Meio Ambiente, não fosse o papel determinante da floresta na regulação do clima da América do Sul. Ocorre que o desequilíbrio climático causado pela devastação da Amazônia afetará o Brasil a ponto de inviabilizar até mesmo os latifúndios do agronegócio, sem que esse setor da economia tenha dado sua contribuição efetiva para alavancar o desenvolvimento de nosso país. Houve, sim, um grande enriquecimento desses proprietários de terras, que se limitaram a aumentar suas fortunas pessoais, gerando pouco emprego em função da mecanização plena de suas atividades, pouco contribuindo, também, com baixa tributação de seus produtos, e gozando de incentivos fiscais que ofendem a dignidade de qualquer cidadão, que paga seus impostos.

Canteiro de obras da Hidrelétrica de Belo Monte
Se a moratória da soja é uma mentira, pouco importa agora. O fato é que a devastação continua ativando seu ciclo perverso: derrubada das árvores nobres, queima do que restou da floresta, criação de gado até a exaustão da terra, plantio de soja e, finalmente, a longo prazo, a desertificação desses territórios. Já não importa quem nasceu primeiro: o ovo da derrubada das árvores ou a galinha da exploração intensiva do solo até sua exaustão. Todos fazem parte do mesmo círculo vicioso e nefasto, que resultará na miséria de nosso povo.

Se os latifundiários nunca respeitaram o Código Florestal, em seus 50 anos de existência até a descaracterização promovida pelos ruralistas, por que o fariam agora, com a infeliz redação aprovada em 2012? E mesmo o fazendo, sua nova redação propicia alternativas suficientemente "flexíveis" para se acabar com a quase totalidade de nossos biomas. Estima-se que mais de 50% da Amazônia poderá ser, legalemente, derrubada pelos latifundiários, graças ao novo código, apenas pela redução das áreas de preservação permanente e das reservas legais. Aliás, em assentamentos do INCRA essas reservas sequer existem mais, devido à omissão desse órgão e da falta de punição dos infratores. Os assentamentos são a evidência do efeito "dominó" sobre as vicinais da Transamazônica!

Se a brilhante contribuição de Aziz Ab´Saber, para que se elaborasse um Código da Biodiversidade, era uma utopia inadmissível para nossa primitiva sociedade de consumo e de desperdício, esse novo "Código Ruralista" será uma sentença de morte a ser aplicada à Natureza, em doses homeopáticas, para que a vítima (nossa Nação) não perceba que está sendo entorpecida por um veneno letal...

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Agropecuária brasileira torna-se mais produtiva, porém mais excludente

Artigo publicado na revista Nature Climate Change analisa mudanças no padrão brasileiro de uso do solo nos últimos 20 anos e ressalta "comoditização" da agricultura

Por Karina Toledo - (Publicado na Revista NATURE)

Agência FAPESP - As mudanças no padrão brasileiro de uso do solo nas duas últimas décadas são destaque da capa da edição de janeiro da revista Nature Climate Change.

Área devastada na Terra Indígena AWA, Maranhão, onde vivem populações de índios isolados, mas cujas florestas hoje representam menos de 50% das áreas originais florestadas. Vale destacar que esses povos ão nômades e necessitam de grandes áreas para sua sobrevivência. As terras indígenas representam cerca de 50% das áreas protegidas do país e de toda biodiversidade conservada.
A boa notícia apontada pelo artigo é que, nos últimos dez anos, ocorreu no país uma dissociação entre expansão agrícola e desmatamento – o que resultou em queda nas emissões totais de gases de efeito estufa. O fenômeno, segundo os autores, pode ser atribuído tanto a políticas públicas dedicadas à conservação da mata como à “profissionalização” do setor agropecuário, cada vez mais voltado ao mercado externo.

Mas essa “comoditização” da produção rural brasileira trouxe também impactos negativos, entre os quais se destacam o aumento da concentração de terras e o consequente êxodo rural.

“As grandes propriedades – maiores que 1 mil hectares – representam hoje apenas 1% das fazendas do país. No entanto, ocupam praticamente 50% das terras agrícolas”, ressaltou David Montenegro Lapola, professor do Departamento de Ecologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro e autor principal do artigo.

As conclusões são baseadas na análise de mais de cem estudos publicados nos últimos 20 anos. Entre os 16 autores – todos brasileiros – estão Jean Pierre Henry Balbaud Ometto e Carlos Afonso Nobre, ambos pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e integrantes do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PRPMCG).

Também participaram Carlos Alfredo Joly (Universidade Estadual de Campinas) e Luiz Antonio Martinelli (Universidade de São Paulo), do Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Estado de São Paulo (BIOTA), da FAPESP.

“Os dados mostram, em 1995, um pico de expansão na agricultura coincidindo com um pico de desmatamento na Amazônia e no Cerrado. Isso volta a ocorrer entre os anos de 2004 e 2005, quando também houve pico de crescimento do rebanho bovino do Brasil. Após esse período, porém, a expansão agropecuária se desacoplou do desmatamento, que vem caindo em todos os biomas brasileiros”, disse Lapola à Agência FAPESP.

Se na Amazônia é claro o impacto de políticas públicas voltadas à preservação da floresta – como criação de áreas protegidas, intensificação da fiscalização feita pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e pela Polícia Federal e corte de crédito para municípios campeões do desmate –, nos demais biomas brasileiros a queda parece ser resultante de iniciativas do próprio setor produtivo.

“As culturas que mais cresceram são as voltadas ao mercado externo, como soja, milho, cana-de-açúcar e carne. É o que chamamos no artigo de ‘comoditização’ da agropecuária brasileira. De olho no mercado estrangeiro, o setor passou a se preocupar mais com os passivos ambientais incorporados em seus produtos. O mercado europeu, principalmente, é muito exigente em relação a essas questões”, avaliou Lapola.

Também na Amazônia há exemplos de ações de conservação capitaneadas pelo setor produtivo, como é o caso da Moratória da Soja – acordo firmado em 2006, por iniciativa da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e da Associação Brasileira dos Exportadores de Cereais (Anec), para impedir a comercialização e o financiamento de grãos produzidos em áreas desmatadas.

“Na Amazônia, a soja tem avançado sobre áreas antes usadas como pastagem. O mesmo pode ser observado no Estado de São Paulo, no caso das plantações de cana. A maior parte da expansão canavieira dos últimos anos ocorreu sobre áreas de pastagem”, afirmou Lapola.

Tal mudança no padrão de uso do solo teve um efeito positivo no clima local, apontou o estudo. Em regiões de Cerrado no norte de São Paulo, por exemplo, foi registrada uma redução na temperatura de 0,9° C.

“A maior cobertura vegetal aumenta a evapotranspiração, libera mais água para a atmosfera e acaba resfriando o clima localmente. Mas a temperatura ainda não voltou ao que era antes de ocorrer o desmatamento para dar lugar ao pasto. Nessa época, o aquecimento local foi de 1,6° C”, disse Lapola.

Êxodo rural

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmam que as áreas dedicadas à pecuária no Brasil estão diminuindo. No entanto, o número de cabeças de gado continua crescendo no país, o que significa um maior número de animais por hectare e maior eficiência na pecuária (o uso do solo predominante no país).

De acordo com Lapola, o mesmo pode ser observado no caso de outras culturas voltadas à alimentação, como arroz e feijão, que tiveram suas áreas de plantio reduzidas embora a produção total tenha aumentado. Graças a esse incremento na produtividade, a segurança alimentar brasileira – por enquanto – parece não ter sido afetada pela “comoditização” da agricultura.

O artigo revela, no entanto, que a concentração de terras em grandes propriedades voltadas ao cultivo de commodities intensificou a migração para as áreas urbanas. Atualmente, apenas 15% da população brasileira vive na zona rural.

Em locais onde a produção de commodities predomina, como é o caso do cinturão da cana no interior paulista, cerca de 98% da população vive em áreas urbanas. “Essa migração causou mudança desordenada de uso do solo nas cidades. O resultado foi o aumento no número de favelas e outros tipos de moradias precárias”, afirmou Lapola.

As mudanças no uso do solo afetaram também o padrão brasileiro de emissão de gases do efeito estufa. Em 2005, o desmatamento representava cerca de 57% das emissões totais do país e, em 2010, esse número já havia caído para 22%. Hoje, o setor agropecuário assumiu a liderança, contabilizando 37% das emissões nacionais em 2010, advindas principalmente da digestão de ruminantes, da decomposição de dejetos animais e da aplicação de fertilizantes.

Novo paradigma

No artigo, os autores defendem o estabelecimento no Brasil de um sistema inovador de uso do solo apropriado para regiões tropicais. “O país pode se tornar a maior extensão de florestas protegidas e, ao mesmo tempo, ser uma peça-chave na produção agrícola mundial”, defendeu Lapola.

Entre as recomendações para que esse ideal seja alcançado os pesquisadores destacam a adoção de práticas de manejo já há muito tempo recomendadas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), como o plantio na palha, além do fortalecimento do Código Florestal (que estabelece limites de uso da propriedade) e a adoção de medidas complementares para assegurar que a legislação ambiental seja cumprida.

“Defendemos mecanismos de pagamento por serviços ambientais, nos moldes do programa de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD), por meio do qual proprietários rurais recebem incentivos financeiros pela conservação da biodiversidade e outros recursos naturais”, explicou Lapola.

Os autores também apontam a necessidade de políticas públicas – entre elas a reforma agrária – que favoreçam um modelo de agricultura mais eficiente e sustentável. “Até mesmo alguns grandes proprietários não têm, atualmente, segurança sobre a posse da terra. Por esse motivo, muitas vezes, colocam meia dúzia de cabeças de gado no terreno apenas para mostrar que está ocupado. Mas, se pretendemos de fato fechar as fronteiras do desmatamento, precisamos aumentar a produtividade nas áreas já disponíveis para a agropecuária”, concluiu Lapola.

O artigo Pervasive transition of the Brazilian land-use system (doi:10.1038/nclimate2056), de David Lapola e outros, pode ser lido por assinantes da Nature Climate Change em www.nature.com/nclimate/journal/v4/n1/full/nclimate2056.htm.

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MINHAS CONSIDERAÇÕES

Apesar das estatísticas mostrarem redução das taxas de desmatamento na Amazônia, elas não evidenciam que as taxas atuais sejam "sustentáveis", ou seja, os índices de desmatamento da Amazônia ainda são assustadores e não asseguram a preservação desse bioma. No ano passado, esses índices voltaram a subir cerca de 28%, fruto da vigência do "novo" Código Florestal, aprovado pelo Congresso durante a realização da Conferência Mundial sobre Preservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável (RIO+20).

Se a concentração de gado nas áreas de pecuária extensiva aumentou, ainda temos baixíssimo aproveitamento de uso do solo, decorrência do desperdício de terras espoliadas pela grilagem praticada por pistoleiros, de forma intensiva nos anos 1970 a 1990, durante a Ditadura Militar. Também os Assentamentos do INCRA contribuíram fortemente para a devastação da Floresta Amazônica e, ao longo do enorme trajeto da Transamazônica, pode-se observar o efeito conhecido como "espinha de peixe", que é a ramificação das vias (travessões) para dentro desses assentamentos. Esse processo continuou durante os governos do PT, que oPTou por utilizar essas áreas como prioritárias para a "reforma agrária".

Observe-se que, mesmo com a redução dos conflitos com o MST, atendido em suas reivindicações por "Reforma Agrária", o êxodo rural aumentou, como mostram os dados do relatório da NATURE. Isso evidencia que não houve, de fato, uma Reforma Agrária em nosso país, senão uma acomodação de pequenos lavradores em pequenas propriedades de baixa capacidade produtiva, sem orientação técnica adequada, e sofrendo as pressões dos latifundiários para ceder suas terras para plantio de soja e criação de gado.

Vale destacar, também, as investidas do Agronegócio contra as Terras Indígenas, nos anos recentes, tentando inviabilizar a Política Indigenista, e tentando impedir que novas terras sejam demarcadas. Muitas terras indígenas foram invadidas durante o governo petista, não apenas por pequenos lavradores instigados pelos latifundiários, mas também pelos próprios fazendeiros, que chegaram a montar "propriedades" de mais de cinco mil hectares, em nome de laranjas e até mesmo de juízes, procuradores e desembargadores.

Portanto, essa "visão otimista" da NATURE não se justifica, não apenas pelos dados que mencionei acima, mas também porque a opção ao Agronegócio é uma péssima alternativa para o Brasil, que agrega as commodities agrícolas à exportação de minérios, dilapidando o Patrimônio Natural do Brasil e condenando as futuras gerações a um país devastado e imprestável para a agricultura, a pecuária e a mineração. Em contrapartida, as nações que souberam se preservar, adquirindo esses produtos do Brasil, terão se enriquecido pelo desenvolvimento de indústrias de alta tecnologia, capazes de asfixiar nossa próprioa indústria, que não recebe os mesmos incentivos fiscais e empréstimos a juros subsidiados, como acontece com o Agrnegócio. Como diz o artigo, “As grandes propriedades – maiores que 1 mil hectares – representam hoje apenas 1% das fazendas do país. No entanto, ocupam praticamente 50% das terras agrícolas”...
Madeireira no interior da Amazônia. Eles são apenas uma parte da cadeia de devastação. Derrubadas as árvores, vem o gado e, depois, a SOJA! (Foto: Silvano Fernandes)