Quando a ONU divulgou o seu relatório sobre a situação mundial das desigualdades sociais e o Brasil se apresentava em uma posição tão degradante, talvez poucos em nosso próprio país tenham se conscientizado da gravidade dessa situação que se arrasta por séculos, e tem sempre a mesma causa e origem: a concentração brutal do poder econômico.
Aqui, em nossas terras, vivem populações inteiras percebendo uma renda irrisória de menos de R$2,00 (dois reais) por dia! Ao mesmo tempo, uma pequena "elite" de privilegiados desperdiça milhares de reais em refeições nababescas, pouco se importando que a fome e a miséria arrastam crianças para a morte, desprovidas dos recursos mínimos para sua sobrevivência.
Riqueza e ostentação narcotizam a mente das pessoas. Quem possui vários carros de luxo em suas garagens, viaja regularmente para o exterior, manda seus filhos para as escolas mais tradicionais e caras do país, possui casa de campo e de praia, milhares de cabeças de gado em terras que parecem não ter fim, televisores e computadores pessoais importados, anda de jet ski em praias sofisticadas... essas pessoas não têm tempo para pensar na miséria que mora nas favelas vizinhas das periferias, ou nas comunidades indígenas e quilombolas às margens de rios e em áreas distantes da civilização!
Civilização? Como podemos nos chamar de "civilizados" quando seres humanos como nossos filhos padecem da miséria das doenças provocadas pela inanição? Como podemos ir a um espetáculo teatral ou a um restaurante sofisticado que nos custa mais do que uma família inteira tem de recursos para sobreviver um ano inteiro? Como colocar a cabeça no travesseiro e dormir placidamente em plumas de ganso e lençóis de seda enquanto não há perspectivas ou políticas públicas para tirar metade de nosso povo da pobreza extrema em que tentam sobreviver?
Pois é... ninguém se importou com os dados do relatório das Nações Unidas... também, pudera! Quanta besteira tínhamos para falar nos Twitter, Orkut, Facebook em nossas horas de ócio e preguiça! Afinal, vivemos estressados com o trânsito, com os bandidos que rondam nossas famílias abastadas, querendo roubar nossas fortunas herdadas de nossos pais...
Ontem os canais da Globo começaram a circular a exposição de um filme tipicamernte americano, onde uma família de doze filhos "sofre" com a mudança de seus pais de uma cidade no interior, onde viviam em um belo rancho, e vão morar em uma mansão de Chicago! Deve ser muito duro para elas, não é mesmo? Deixar para trás seus amigos, namorados...
As novelas da TV também costumam retratar com frequência a riqueza como se fosse um mérito, um privilégio dos "melhores", dos eleitos por algum poder sobrenatural, que premia os "bons" (falsos arianos) e pune os "maus" (negros, caboclos, índios...). Por que será que os protagonistas sempre são bonitos e os vilões feios? Seria essa a tendência na(rci)zista dos homens?
A sensação que tenho é que, para nossa burguesia colonial, que gerou as castas mais abastadas de nossa sociedade, um relatório que expõe a miséria em seus números mais cruéis, deve lhes parecer estranho e irreal como os livros de ficção mais absurdos! Algo como "Alice no País das Maravilhas", só que às avessas! Ou então o nosso "Arquipélago Gulag"!
Mas não poderemos fechar nossos olhos por muito tempo, pois a população do mundo (e também a do Brasil) cresce muito mais nas camadas mais pobres. Por isso eles se tornam cada vez mais numerosos, e logo nos incomodarão mais e mais, até que não seja mais possível escondê-los nas favelas, nas várzeas, nos morros e nas comunidades esquecidas por Deus.
Esquecemos que somos mestiços, que não temos sangue azul, que nosso futuro está nessas crianças mestiças e miseráveis que relegamos à marginalidade. Até quando vamos ignorar essa verdade óbvia e nos iludir acreditando que esse Brasil desgraçado não é o nosso país?
Frigoríficos afirmam ter parado de comprar gado de terras indígenas e unidades de conservação, um ano após o lançamento do relatório do Greenpeace sobre pecuária na Amazônia.
Os três maiores frigoríficos do Brasil – JBS/Bertin, Marfrig e Minerva – anunciaram na última semana que deixaram de comprar gado de 221 fazendas localizadas dentro de terras indígenas, unidades de conservação ou próximas a áreas recém-desmatadas na Amazônia. Outras 1.787 propriedades, num raio de até 10 quilômetros de novos desmatamentos, unidades de conservação e terras indígenas, passam por averiguação. As empresas declararam também ter o ponto georreferenciado de mais de 12.500 fazendas, número que, segundo elas, representa 100% da cadeia de fornecedores diretos da região.
"A apresentação desses números é uma clara e bem-vinda sinalização de que o setor está de olho nas novas exigências do consumidor preocupado com o meio ambiente em todo o mundo. As empresas precisam agora ampliar e consolidar esse trabalho, realizando auditorias nos processos, garantindo transparência e confiabilidade aos dados e convencendo seus fornecedores a disponibilizarem mapas com os limites georreferenciados das propriedades", afirma Paulo Adario, diretor da campanha da Amazônia do Greenpeace.
Os resultados entregues, nove meses após a assinatura de acordo entre os frigoríficos e o Greenpeace (assinado em outubro do ano passado), correspondem à primeira etapa do compromisso assumido pelas empresas-líderes do setor da pecuária com desmatamento zero na Amazônia: cadastrar e mapear todas as fazendas de seus fornecedores diretos, para não comprarem mais gado proveniente de áreas recém-desmatadas na região, de terras indígenas e áreas protegidas.
O monitoramento dessa cadeia produtiva é essencial para que clientes e consumidores de produtos bovinos não contribuam indiretamente para a destruição da maior floresta tropical do mundo. No entanto, para que esse processo ocorra de forma eficaz e transparente, é indispensável a realização do Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades, ferramenta que possibilita monitorar por satélite e identificar com segurança todos os fornecedores – tanto os que produzem sem desmatar quanto os que desmataram a floresta após outubro de 2009.
No Mato Grosso, detentor do maior rebanho do país, menos de 5% das fazendas estão cadastrados no sistema de licenciamento ambiental do governo do estado. A exigência do cadastro é lei e tem prazo para ser cumprida: novembro deste ano. No Pará, o número de fazendas registradas junto ao CAR – Cadastro Ambiental Rural – saltou, em menos de um ano, de cerca de 300 para 19 mil propriedades inscritas, devido às pressões exercidas por consumidores e pela atuação do Ministério Público Federal, que moveu ações obrigando parte da cadeia a realizar o cadastramento. Porém, esse número ainda representa apenas 9% do total de propriedades do Estado.
"As pressões dos frigoríficos são fundamentais para promover o cadastramento das fazendas nos Estados. Também vamos cobrar daqueles que ainda não assumiram nenhum compromisso com a floresta. Os consumidores precisam saber quem ainda não está se mexendo para tirar o desmatamento de seu negócio", afirma Adário.
Os três frigoríficos responderam, em 2009, por 36% do abate feito na Amazônia Legal. O restante vem de pequenos, médios e grandes frigoríficos que até agora não assumiram compromisso com o desmatamento zero e vendem seus produtos para os consumidores, por meio de supermercados que ainda não limparam suas prateleiras de passivos ambientais e sociais.